quinta-feira, 5 de março de 2009

Mau exemplo!

Lula usa advocacia geral da união para se defender da acusação de propaganda eleitoral antecipada


Alberto Rollo*

Alexandre Rollo**


É de conhecimento geral, que amplamente divulgado pela imprensa, que o Governo Federal realizou, nos dias 10 e 11 de fevereiro do corrente ano, o denominado Encontro Nacional de Prefeitos e Prefeitas. Em razão de tal evento dois partidos de oposição (DEM e PSDB), ajuizaram uma representação eleitoral contra o Presidente LULA e contra a Ministra Dilma Roussef (RP n°. 1400 em curso no TSE), onde ambos são acusados de realização de propaganda eleitoral antecipada, tendo em vista as eleições de 2010. Para que se resuma tal processo, enquanto a oposição diz que houve a utilização de evento público para atender a interesses político-eleitorais privados, a situação defende a legalidade de seus atos, destacando o Decreto n°. 6.181, de 3 de agosto de 2007, que instituiu o Comitê de Articulação Federativa – CAF. O TSE, em breve, dirá se houve ou não ilícito eleitoral, quando da realização do tal encontro de Prefeitos e Prefeitas.

O que importa destacar no presente artigo, no entanto, é que, enquanto se discute eventual ilícito eleitoral sem maiores repercussões jurídicas (o máximo que pode ocorrer, em caso de condenação dos us, é a aplicação de multa aos infratores), tem-se que os cidadãos Luiz Inácio e Dilma Roussef se fizeram defender, naquele processo eleitoral e pessoal, pela Advocacia Geral da União, ou seja, por advogados pagos pelos contribuintes brasileiros. Repita-se: a defesa de 29 laudas apresentada pelos acusados foi assinada por três advogados pagos com recursos públicos. Importante ressaltar que a figura da União (pessoa jurídica de direito público interno), não se confunde com as pessoas de Luiz Inácio e Dilma Roussef, e que somente os interesses processuais da União, ou de seus representantes, desde que processados por atos praticados sem desvio de finalidade, autorizariam a atuação da Advocacia Geral da União.

Para citarmos dois exemplos, administrador público que, no exercício de sua função, pratica um ato administrativo taxado de ilegal e sujeito a Mandado de Segurança, pode ser defendido por advogado público. administrador público acusado de desvio de finalidade (Ex.: utilizar algo público em proveito privado), não tem esse mesmo direito, que a “vítima” do ato praticado pelo administrador seria o próprio órgão público por ele administrado. A Ministra Eliana Calmon, do STJ, decidiu o seguinte, acerca de tal tema: “...3. Entretanto, quando se tratar da defesa de um ato pessoal do agente político, voltado contra o órgão público, não se pode admitir que, por conta do órgão público, corram as despesas com a contratação de advogado. Seria mais que uma demasia, constituindo-se em ato imoral e arbitrário”. Esse parece ser o caso aqui comentado, que Lula e Dilma são acusados de terem usado um ato público (encontro de Prefeitos), com finalidade privada (propaganda eleitoral antecipada de Dilma para Presidente da República em 2010).

Esse mau exemplo transportado para a esfera Municipal, significaria verdadeira carta branca para que os mais de 5000 Prefeitos e Prefeitas brasileiras, doravante, passem a se valer dos Procuradores Municipais, para suas defesas em processos eleitorais como aquele em questão. Ex.: Prefeito inaugura uma obra pública em seu Município, sendo acusado, pela oposição, de ter realizado propaganda eleitoral antecipada. Citado, o Prefeito acusado poderia ser defendido pelos Procuradores do Município, ou, na sua falta, por advogado contratado pelo Município para tal defesa. Ou seja, se nada for feito pelo Procurador Geral da República para coibir tal prática, o raciocínio passará a ser um : se o Presidente da República pode usar advogado público para se defender em processo eleitoral, o Prefeito também pode. Isso porque não se pode adotar dois pesos e duas medidas.

Para que o leitor possa formar sua convicção acerca do tema, a Lei Federal n°. 1.079, de 10 de abril de 1950 (que define os crimes de responsabilidade do Presidente, do Vice e dos Ministros), define como crime de responsabilidade contra a probidade na administração a expedição de ordens ou a realização de requisiçõesde forma contrária às disposições expressas da Constituição” (art. 9º., item 4). Assim, em tese, estaríamos diante de uma requisição (ainda que implícita), feita pelo Presidente da República, para assessoria jurídica em processo de natureza eleitoral (privada), requisição essa aparentemente contrária aos princípios da legalidade, da moralidade e da impessoalidade, todos previstos na Constituição Federal, cujas sanções, uma vez reconhecida tal prática, são as seguintes: a) perda do cargo; b) inabilitação, por até 5 anos, para o exercício de qualquer função pública (art. 2º., da Lei n°. 1.079/50). Tudo isso, por óbvio, após processo e julgamento pelo Senado Federal, nos termos do art. 52 da Constituição Federal.

Ou seja, enquanto discutem eventual ilícito eleitoral sem maiores conseqüências, senão o eventual pagamento de multa, o Presidente da República e a Ministra-Chefe da Casa Civil, podem ter praticado crime de responsabilidade passível de perda do cargo e inabilitação por até 5 anos, ao serem defendidos, em processo particular e eleitoral, por advogados que deveriam defender, tão somente, os interesses processuais da União ou a ele correlatos.


Com a palavra o Procurador Geral da República.


*Advogado e Presidente do Instituto de Direito Político Eleitoral e Administrativo - IDIPEA.

**Advogado, Professor Universitário, Mestre e Doutor em Direito das Relações Sociais.

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